Monday, April 21, 2008

Um dia

Em paz.

Monday, March 31, 2008

Primavera


(Tinha-me esquecido que tinhas chegado. Desculpa)

Quando te vi senti um puro tremor de primavera
e a voluptuosa brancura de um perfume
No meu sangue vogavam levemente
anémonas estrelas barcarolas
O silêncio que te envolvia era um grande disco branco
e o teu rosto solar tinha a bondade de um barco
e a pureza do trigo e de suaves açucenas
Quando descobri o teu seio de luminosa lua
e vi o teu ventre largamente branco
senti que nunca tinha beijado a claridade da terra
nem acariciara jamais uma guitarra redonda
Quando toquei a trémula andorinha do teu sexo
a adolescência do mundo foi um relâmpago no meu corpo
E quando me deitei a teu lado foi como se todo o universo
se tornasse numa voluptuosa arca de veludo
Tão lentamente pura e suavemente sumptuosa
foi a tua entrega que eu renasci inteiro como um anjo de sol

António Ramos Rosa

Miguel

E quando partilhamos com um estranho a intensidade de uma Vida?
Que nos foge em segundos depois de segundos, que foram dias ou semanas, tão eufóricas?
O acaso é mesmo o melhor conselheiro do destino. Li, um dia. Ou semelhante. E por aí fiquei.
A noite estava fria. Eu estava quente.
A gare estava deserta. Eu estava preenchido. Tinha estado e estava ainda.
Amigos de ocasião ou para toda a Vida? Vagabundos na noite. Que acabou de madrugada.
Numa Lisboa que amanheceu e anoiteceu de formas tão diferentes. Em tão curto espaço de tempo.
A música acompanhava-nos.
Ele, para sempre Miguel, ia exigindo novas experiências.
“Que tens mais aí?”
“E mais um cigarro”.
“Abrimos outra cerveja?”.
O Mundo numa conversa.
“Por onde achas que é o caminho?”.
“Em frente. O Caminho é sempre em frente”.
O desabafo que se impunha. A um amigo. Certo, na hora certa. O melhor para o momento.
Num espaço de ressaca.
Mental a minha (num turbilhão).
De Vida. A dele.
Cansados. No chão.
Um chão que era dele. Fui convidado a entrar. A partilhar a casa. Sem cerimónias.
“É um espaço público. Senta-te”.
Sentei-me. Já lado a lado. Como irmãos.
De necessidade também.
“Obrigado. Acho que tenho de ir. É às sete e nove. Devo chegar às dez a casa. E tenho de mandar a tal mensagem”.
Riu-se.
“Dá-me mais um cigarro. Só um”.
Ficou com o maço.
“Vale sempre a pena acreditar. Acredita e deseja. Vai ser possível”.
Com uma certeza incrível.
“Ah! E prepara essa mensagem. Quando tiveres tecto". Ele ia tendo. Vários.
Obrigado. Pensei.
Não tive coragem de voltar a abrir a boca.

Obrigado Miguel. Pela Lição. De Amizade.

Saturday, March 29, 2008

Into my (our) arms


Calle Principe, 25

Perdemos repentinamente
a profundidade dos campos
os enigmas singulares
a claridade que juramos a conservar
mas levamos anos a esquecer alguém
que nos olhou apenas

José Tolentino Mendonça

PS: e tocou.

Thursday, March 13, 2008

Vestígios


noutros tempos

quando acreditávamos na existência da lua

foi-nos possível escrever poemas e

envenenávamo-nos boca a boca com o vidro moído

pelas salivas proibidas - noutros tempos

os dias corriam com a água e limpavamos líquenes das imundas máscaras

hoje

nenhuma palavra pode ser escrita

nenhuma sílaba permanece na aridez das pedras

ou se expande pelo corpo estendido

no quarto do zinabre e do álcool - pernoita-se

onde se pode - num vocabulário reduzido e

obcessivo - até que o relâmpago fulmine a língua

e nada mais se consiga ouvir

apesar de tudo

continuamos e repetir os gestos e a beber

a serenidade da seiva - vamos pela febre

dos cedros acima - até que tocamos o místico

arbusto estelar

e

o mistério da luz fustiga-nos os olhos

numa euforia torrencial

Al-Berto / Horto de Incêndio

Wednesday, March 12, 2008

.

Fechar as janelas e deixar o Sol e o Ar esconderem-se.

Penúmbra total.

Amanhã (ou outro dia) respirar!

Friday, February 29, 2008

Saudade

Saturday, February 09, 2008

Desejo de...

... sentir-te em pé. Abraçada. Corpo contra corpo. Guerra feroz e sem segurança.
Num sofá deitado no mar. Desta vez conseguido.

Desejo de...

... molhar os teus secos lábios

Monday, January 14, 2008

I

Não te quero deixar entrar. És luz. Futuro. Mas também és saudade. E saúde.
“Ouve. Quero dizer-te: É aqui que queres estar comigo? Prometes ser sempre? Assim?”
São raios de luz e imagem. Cadeiras dispersas e ervas em desalinho. Mas a porta que é janela e postigo aberto para o Mundo exige mais de ti.
Ela estava deitada. Ele permanecia sentado. No chão.
O telhado do velho hospital debitava a imagem que lhe manchava a saudade.
Pedrógão Grande. Abreviado para pequeno. Pelo tamanho. Do telhado. E do hospital.
“Já viste?”
“Sim. Já te ouvi.”
“Perguntei se viste.”.
“Já te ouvi”.
Chegava.
O tecto permanecia branco e também o acaso do hospital era branco.
O médico branco era. De idade. De velhice. Do álcool que o consumia. Do álcool do hospital. Do etílico sabor do espaço. Que venerava. Que era dele. E de mais alguns. Como são os espaços pequenos. Sem opostos. Nem oposição. Porque não há oposições a hospitais. Nem oposições em pequenos territórios. E em grandes?
“Como nos deixámos chegar aqui?”.
“Não sei. Mas não era isso que tentámos. O nosso sonho não era esta cama?”.
Depois de outras. Perguntou-se.
De outras camas?
Pensou.
“Era.”,
“Era uma cama. Mas esta?”.
“Não gostas desta cama?”.
“Não”.
“Não gostas?”.
“Não gosto!”.
Ele permanecia no chão. Ela na cama.
“Anda. Anda para o chão”.
“Espera. Que horas são?”.
“Isso interessa?”
“Interessa. Tem de ser hoje. 24. Hoje é dia 24”.
“Anda para o chão”.
“Será no chão. Se queres será no chão. Mas é a primeira vez”.
“Mas será no chão. Eu ajudo-te.”
“É a nossa primeira vez. A nossa. Não somos nós?”.
Nasceu.
A 24 de Junho. Ou de Julho. Já não me lembro.

Saturday, December 22, 2007

Espera

Chama-se James. Espera.
Espera uma companhia para a ópera.
Espera a amiga que ama secretamente. E hoje, entre sons, é O dia. Vai revelar.
Uma dor dilacerante oprime-lhe o peito em cada respiração. Não pode mais adiar.
Procura concentrar-se no que lê e, na cabeça (na dele), soam-lhe sempre as palavras que quer dizer.
Aquelas malditas palavras que lhe custaram tanto dizer quando seis meses atrás a encontrou caída. Não no chão.
Sabia que ela estava diariamente presente.
Era a sua melhor amiga.
Mas não se lembrava de sentir tanto a dor da perda quando percebeu que um dia a poderia não encontrar senão dissesse tudo o que verdadeiramente sentia desde sempre e havia decidido:
Seria hoje e não podia mais adiar e ainda assim tremia e os suores frios que quentes pareciam e assim seriam não fosse serem mesmo frios não ajudavam a acalmar.
“O sexo é o consolo de uma pessoa quando lhe falta o amor.”
(GGM).
Acordou nesta frase.
Na noite anterior. Essa.
A noite antes da ópera (que ópera?). Tinha procurado aleatoriamente a ausência de amor alheio.
Ele. Pensava assim. Em definitivo.
(A solo).
O ruído parou. E a carruagem também. Chegou. Parou. E ele ficou.
Não foi. Nunca ia. Ficava sempre.
Não a carruagem nem ele. Ele foi.
A carruagem também.
Ficaram palavras.
E eles ficaram.
Amigos.

Brilho Âmbar

Os catalisadores das emoções foram o ponto de partida. Aquilo que se sente se diz se sente e nem sempre se diz. Se perto se longe ou se como é. Se foi assim que começou e teima em fortalecer.
Como âmbar. Fossilizar.
“Perpetuar de uma maneira materialista”. Mas como?
Haverá forma menos imaterial que esta?
De imediato recordei.
Também a propósito de um livro. Que não dobra porque permanece Mas porque toca não como sinos mas como harpas que se imortalizam.
“- É como se te tivesse dado, em vez de estrelas, inúmeros pequenos guizos que sabem rir.”. Rir e fazer.
A música, a que propósito, saltava de James para Simon and Garfunkel antes dos dotcom.
Não quero dar novas dimensões a palavras antigas nem oferecer-lhes novos sentidos. Não quero. Nem sei. Muito menos sei.
Mas se conseguir, um dia que seja um minuto até ou um segundo qualquer, pôr ali um bocadinho que seja de Sol.
Fez-se Luz.
Vamos. Aí vamos nós agora por aqui.
Fazer-nos entender. Fazer-me entender. Entender e agradecer.
Pode andar ao contrário. O Mundo.
E pode até a distância estar sempre presente. Não significa estar sempre. Nem perto nem dentro nem fora lado a lado ou em cima em baixo a sul a norte. Muito a norte. Muito a sul. Centro ao centro. À direita!? À esquerda. Pois é! O lado do coração. Dizem. Os que sabem e dizem que sim.
Isto é como música. Intemporal.
That’s the living!

Sunday, December 02, 2007

Beijo

A rua parecia deserta. Era de noite. Frio ou talvez não. Era Inverno e não chovia. Perdidos.
No primeiro beijo.

Fotografia de molin da Colecção do Joe

Corpos

Corpos quase inanimados. Conversas soltas e sem pretensões. Ainda que à luz das velas, altivas, os olhos permaneciam fechados e o tacto (os tactos) parecia suficiente para acertar na escolha das palavras. A ausência, prolongada e doentia e dolorosa, tinha sido rapidamente satisfeita e os corpos, inanimados, quase inanimados, mantinham o contacto e o sabor. O sabor sempre desesperante. Olhos nos olhos e corpo no corpo. A respiração permanecia tranquila. Não tinha sido ofegante. Os espectadores apreciavam. Com espanto. E cada um imaginava a sua história.
Fotografia de Molin da Colecção do Joe

Wednesday, October 24, 2007

Esquisso ou não


“Não há forma nenhuma de se verificar qual das decisões é melhor porque não há comparação possível. Tudo se vive imediatamente pela primeira vez sem preparação. Como se um actor entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que vale a vida se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É o que faz com que a vida pareça sempre um esquisso. Mas nem mesmo «esquisso» é a palavra certa, porque um esquisso é sempre um esboço de alguma coisa, a preparação de um quadro, enquanto o esquisso que a nossa vida é, não é esquisso nem nada, é um esboço sem quadro.”

M.K., A I L D S.

Thursday, October 11, 2007

@ Baku - A Cidade Organizada

Um trânsito caótico e desorganizado o suficiente para ser localmente organizado, com constantes filas de trânsito e paragens naturais no meio das vias caracterizam bem Baku, cidade que recebe sábado o Azerbaijão-Portugal, de apuramento para o Europeu de futebol.
Com quase três milhões de habitantes – uma imensidão para a área da cidade – a capital do Azerbaijão está fortemente marcada pela exploração petrolífera, no aproveitamento directo do imenso e poluído Mar Cáspio, mas mais, sobretudo para os visitantes, pelo trânsito, que roça, amiúde, a irregularidade.
Uma simples viagem de cinco quilómetros pode tornar-se uma dor de cabeça e demorar, na tranquilidade azeri, 30 longos e sonoros minutos, tantas são as buzinas que agitam a frenética cidade.
Com largas avenidas, quase sempre de duas faixas que, logo, se transformam em três ou mesmo quatro, o “palco” de mais um encontro decisivo da selecção portuguesa, clama por desenvolvimento ainda que, seja já notória grande evolução.
Lojas das populares e citadinas marcas que ditam a moda no centro da Europa, restaurantes de luxo, bares e outros locais de “culto” nocturno aceleram o ritmo da cidade que, não tanto à semelhança de Nova Iorque, parece não dormir.
Além de tudo isto, o parque automóvel parece mais ou menos cuidado – as “mossas” ficam para tratar depois – e os autocarros e táxis são autênticas “latas de sardinha”, tal a acumulação de utentes.
Mesquitas, museus históricos – a cidade foi fundada há 1500 anos – e muitos e emblemáticos edifícios ainda “carregados” com as marcas da ex-União Soviética também sublinham a maior cidade do Azerbaijão.
Ainda assim, a cidade fica mesmo marcada pelo trânsito e pela hospitalidade das pessoas que, em última instância, se tornam tão simpáticas ao ponto de exigir um táxi para os portugueses que precisam de encontrar um restaurante que, afinal, ficava a longos… 500 metros.
O Azerbaijão parece ser assim e, hoje, a comunicação social presente teve direito a dois brindes de encher o olho.
Primeiro, em Sumqayit, cidade próxima e na qual a selecção portuguesa treinou, dezenas, senão centenas, de crianças, rodearam o autocarro e, num banho de multidão inédito para os profissionais da comunicação, quase suplicaram por um simples aceno ou cumprimento mais efusivo.
Depois, no regresso a Baku, o motorista, já de si altamente tranquilo, decidiu e bem – porque até se pouparam vários minutos -, entrar numa avenida em sentido contrário, acenando tranquilamente àqueles que lhe buzinavam.
Pouco depois, o mesmo motorista, ávido de um espelho de um “espada” Mercedes, decidiu novamente bem, não deixou entrar o apressado – qual apressado afinal? – e roçou o suficiente para avisar: “Se queres entrar, ficas sem retrovisor!”. E assim foi.
Porém, insatisfeito pelo estrago, o condutor lesado estacionou no meio do trânsito, saltou aos berros para o meio da via e parou as centenas de automóveis que por ali circulavam.
Paragem aqui e mais paragem aqui, discussão e mais discussão, a polícia que vem, mas afinal já não e lá se seguiu viagem… na tranquila e desorganizada o suficiente para ser localmente organizada cidade de Baku.

Friday, September 21, 2007

Encantamento(s)

Descobri em tempos que foram hoje e são de sempre a Palavra. Sei e sabes e sabemos todos e mesmo que não queiramos vamos sempre saber que o(s) encantamento(s) é (são) de sempre e para sempre e sabes também que demonstras sempre esse(s) encantamento(s).
É recorrente.
Falas com desejo e com prazer adiado. Fugiste e não te arrependes. E no minuto seguinte estás arrependida. E querias ter sabido e se soubeste não queres mais saber. Ou queres.
Nem sei bem se percebeste e se não quiseste ficar. Não sabes bem se traíste e se não querias. E sabes que querias e não esqueceste. E falas e dizes e lembras e com saudade falas de novo e pensas e guardas esse desejo.
É recorrente?
E depois há as lembranças e as conversas e as trocas e os segredos e os risos partilhados. E porque não vamos só os dois? E vamos de novo e não sabes e estás baralhada e há encantamento(s).
E interessa pouco e agora e até amanhã ou quando lermos isto de novo e em voz alta e de mão dada nem sabemos bem que encantamento(s) é esse.
E quando te pergunto dizes que não respondendo que sim e foges e desvias e no meio e quando nada o espera voltas ali e ficas e gostas e não deves ter vergonha e porque não corres atrás dos riscos se queres e até acreditas e podia ter sido diferente não podia?
E sem vírgulas vais acreditando que agora é diferente e esqueces que podia ter sido igual e se até foi e não vamos mais por aí porque interessa pouco e sabes agora há e houve e será sempre assim.
Por isso é que há encantamento(s).

E como são 100 vezes 100 e vezes mais alguma coisa que será encantamento e que é mas também foi assim antes e mesmo antes de sabermos até quem eras. E quando nasceste tinhas os olhos fechados e não quiseste abrir.
E o Mundo já era teu e já o conhecias e não querias saber mais que te esperava. Era brilho de olhos fechados não eram palavras que rasgavam pálpebras nem facas que rasgavam cartas ou punhais que eram palavras.
Era o nascimento e a vida e o sonho que era viver assim e feliz e até encantada que não é de hoje nem podia mesmo ser porque não queremos e queremos lembrar e viver e até sair um dia que seja perfeito porque todos são.
E as palavras que nos cunham e cravam e ferem e deixam saudades são as mesmas que te fizeram conhecer a Palavra e não foi hoje nem no Verão anterior nem em outro qualquer porque são palavras que gritam e ficam e escrevem-se e dizem-se com sentimentos e até porque essa é a nossa Palavra e foi outro dia tudo e manteve-se e quiseste repetir.
E hoje é o 100 vezes 100 e vezes mais alguma coisa e multiplico em ti e por ti e até por nós que somos tu e eu num só a Palavra.

Thursday, September 20, 2007

Pequenas Explosões

- "Sinto pequenas explosões dentro de nós"!
Disse-lhe um dia. Um dia conselheiro do destino, como são os acasos. Os melhores conselheiros do destino. Dos destinos.
- "Só por dentro de ti rebentam flores", lembrou-se no imediato. E partilhou.
Há noites que começam com trânsito. Caminhos e banhos e depois distâncias partilhadas e saudades insaciáveis.
Pequenos toques ou olhares. Pequenos desejos e explosões. Mas antes. Sim. Antes.
Antes de tudo.
- "Não ralhes comigo hoje. Preciso muito de mimos".
E havia árvores. E até padres. E religiões.
E o profano abraçado ao sagrado. Porque todos os momentos são sagrados.
- "Continua. Desculpa. Mas quero. Fica. Fica".
E as conversas corriam a velocidades loucas. Como estava a noite.
- "E quero ir já". E ficaram. E ninguém vai e vamos todos e todos querem ir.
- "E podemos?".
E treinaram bem? E foram capazes?
Não. Não foram. Nunca resistem.
- "E queria descer a escada e beijar-te". E queria.
E dizia que sim. E queria de novo.
E foram? E não conseguiam abrir os olhos.
E novas explosões.
- "Já é de dia".
Pequenas erupções. Que fazem quere-los mais vida.

Monday, September 10, 2007

Butterfly on a wheel

Anda. Gira. Procura o Sol

- Há quanto tempo plantaste estes girassóis?
Era uma pergunta sem significado. Daquelas que desbloqueiam conversas mas que ficam por aí.
- Quantos anos tens? Ou que fazes? Ou por onde andas?
Nada disso queria.
Queria conversar. A sério. Conversar.
- Estás bem? (e esperar pela resposta. Em angústia).
Lembrava-se de dias e dias de folia. De tempos em que era feliz e vivia bem com a idade. E com a felicidade. E que não era bem a mesma coisa.
E depois recordava-se do tempo em que tinha fobia de escrever. E do tempo em que tinha vício. Mais do tempo em que era viciado.
- Há quanto tempo plantaste estes girassóis?
(São girassóis, não são?).
E porquê o Dali na parede?
E porquê o cheiro de uma casa quase desconhecida mas que sabia a vida e a sempre?
(E a pão quente e a fogueiras).
(Comigo foi sempre assim).
E porque vamos sem pensar e ressacamos sem sentir?
- E há quanto tempo plantaste estes girassóis?
E depois a conversa continuava.
E até podia falar-se de chuva e de metáforas matemáticas.
- E como vais?
- E tens passado bem?
- E estou bem e tu também?
E como estão os girassóis? (Que raio de pergunta!).
E depois ela vinha e ia.
E ele também ia. E depois perguntava pelos girassóis.
E ela respondia e ele também.
Havia gritos mais audíveis que outros.
(Nem sempre os sons medem sentimentos).
- E então?
- E agora?
Que raio?
- Porquê os girassóis?
- Procuram o Sol.
- Obrigado.
- Também pelo Dali.
(E já nem falo nos elefantes).

Elos


Ainda que a ferrugem teime em massacrá-los.
Ainda que a água os tente maltratar.
Ainda que as mãos procurem desprezá-los.
Ainda que roçar os faça chiar de dor.
São Elos... Inquebráveis

Foto retirada do olhares, como muitas outras (fica aqui o registo, tardio).

Tuesday, August 21, 2007

@ Yerevan - Pensamento Verde Esperança

Erevan é a capital e maior cidade da Arménia, sendo também uma das suas divisões administrativas, com estatuto diferenciado em relação às províncias.
Está situada nas margens do rio Hrazdan, com coordenadas 40°10′N 44°31′E.
Erevan tem mais de 2.780 anos de história, sendo uma das mais antigas cidades do mundo.
E bla bla bla.
E já viveu tudo: guerras, sangue, dificuldades.
Mas reergueu-se
E tem esperança e tem vida e tem verde e tem pensamento positivo.
E nós também temos esperança e temos sempre vida e temos sempre verde e verde e verde.
E temos sempre pensamento positivo.
E temos um imenso sorriso nos lábios, mesmo que as voltas da vida, às vezes, sejam traiçoeiras.
BOM DIA!

Sunday, August 19, 2007

Lisboa

Friday, August 10, 2007

E eles vivos

Ela do lado direito dele e ele do lado esquerdo dela naturalmente e do lado dizem em que bate o coração e ela a caminhar e ele a caminhar com ela e ela a falar e ele a falar com ela e eles felizes e eles à procura e eles a falarem sozinhos e eles dizem que vão e eles vão e sabem que vão.
E ela do lado direito dele e ele do lado esquerdo dela e ela a dizer que do lado direito também bate o coração e ele a dizer que sim e que vão e que podem ir os dois e que o coração bate do lado que eles quiserem.
E ele do lado esquerdo dela e ela do lado direito dele e o coração a bater ao mesmo ritmo e a praia e o sol e eles a caminharem e ela a falar e ele a falar com ela e eles juntos a pisarem a areia e eles a irem e eles a pensarem que vão e eles com a certeza que irão.
E eles lado a lado e eles sem lados direitos nem esquerdos e eles a caminharem e eles à procura e eles a falarem e eles no fundo em silêncio a sentirem e eles apenas a ouvirem o coração.
E eles vivos.

Tuesday, August 07, 2007

Praia (outra vez)

Ele na água. Ela à espera. O corpo preparado e desejoso. O calor
(do dia, da areia escaldante. O dela).
Ele na água. O calor
(escaldante na água. À espera. Dela).
Ela ficou. E ele apresentou-se sem pudor.
Alguns espectadores. Poucos e sem palmas. Nem gritos de apoio. Ao longe.
Silêncios partilhados e gemidos de prazer.
- "Anda. Entra e fica. Fica!".
Movimentos bruscos e descompassados
(harmoniosos). Pés firmes na areia na areia. Escaldante.
(Escaldantes. Os corpos e os pés e os joelhos e as costas e os peitos. E tudo e tudo).
E o Mundo que parou. E o grito que não se ouviu. E o céu que se pintou!
E vamos!
Marcas no chão deserto. Água que aquecia cada vez mais e levava os símbolos. Que vinham logo depois em outra maré.
Corpos loucos. Línguas perdidas pelos corpos. Perdidas nelas.
- "Molha-me".
- "Refresca-me".
- "Abraça-me e mata-me".
- "Seduz-me de calor. Ataca-me. Investe"
- "Sim! Investe".
- "Gosto das tuas investidas!"
E silêncios. E cópias...
- "Quero rebolar-me em ti e Quero estar envolvida e Quero ser arrepiada por ti e Quero enrolar-me nos teus braços e Quero perder-me em nós e Quero estar suada, escorregar pela tua pele, ter as tuas mãos a balançar-me as ancas, o meu peito cravado no calor do teu e Quero com força, quero com tudo, quero dentro de mim, quero a ouvir o som quente e a dançar descalça".
- "E quero tudo!"

Monday, August 06, 2007

Recordações da Lagoa da Paixão

Não sonhei contigo, mas recordei-me de ti e de uma fotografia. Perdida, como tantas que vagueiam sem rumo nesta memória ilusória. Pautada pelos desejos do vento.
Do vento que sentimos neste dia. E que tínhamos sentido na noite anterior.
(Não sei quantas noites foram).
Estava vento. Disso lembro-me. Estavas radiante.
(Como estás sempre que nos vemos).
Também me lembro.
Recordo-me do que disseste quando parámos. E do que disseste quando continuámos. Disseste para não parar. E disseste para não continuar.
Não querias continuar, mas também não querias que parasse.
(Nunca soubeste o que realmente querias).
Mas parámos. O carro.
E sentámo-nos. Perto e distantes. Distantes mas próximos.
Deste-me a mão e choraste.
(Choras sempre quando estás bem).
Nunca te tinha visto chorar daquela forma.
Começaste a falar de coisas sem sentido. As alterações climáticas preocupavam-te. Lembro-me agora.
Depois falaste da Lua e de como gostas da Noite. Dos teus amigos, que alguns são nossos, e da Vida que tinha sido nossa
(e que era, naquele dia, novamente).
Perdeste-te na Literatura dos teus Sentidos e deambulaste por Livros que nunca tinhas lido.
Alguns eram nossos. E outros eram teus. E outros não eram de ninguém porque não existiam.
Falaste sem parar.
Comias as palavras e abafavas os sons.
Dizias o que querias e o que não querias.
Vagueaste pela Matemática das Emoções e acendeste novo cigarro. Quando até tinhas deixado de fumar
(cigarros).
E falaste. E voltaste a falar. E comeste as palavras. E abafaste os sons.
E disseste para não parar. E para não continuar. E pediste que não. E disseste que sim.
E sorriste no fim.
- "Esta é a Lagoa da Paixão".

Sunday, August 05, 2007

Jeremias, o Troca Pingas e o grande Zé Passarinho

Não são as mesmas personagens, mas até podiam ter sido amigos.
Ou foram mesmo. E ainda são. Em Lisboa.
Nessa cidade que é nossa. E podia ter sido. E foi.
E continua a ser.
Não é sempre?
(com um funicular que abre caminho para o Carmo?)

Thursday, August 02, 2007

Raios

Sempre raios. Sempre raios de sol.. Já viste como são os reencontros?
Falámos de uma hora. Começámos meia-hora mais cedo. E meia-hora antes não resistimos.
Foi assim, não foi?
Adiámos. Parámos e voltámos a acreditar. Depois pensámos e fomos.
Era desejo. Obrigatório. A exigência de Verão.
Músicas que desconheciamos. Juntos.
Sons que queríamos vibrar de novo.
Exigência de Verão?
Não! De sempre.
E depois?
Depois.. havia o depois.
Aquela vontade. Aquele prazer de ruas desertas. Em sítios desconhecidos.
Porque queríamos algo inédito.
De aventuras e de abraços.
(Como são os abraços)
De pedidos. Satisfeitos.
De ti....

Wednesday, August 01, 2007

Entrelaçados nos Son(h)os

Invade-lhe as noites. Todos os dias. Invade-lhe os pequenos cochilos em frente à televisão ou em esperas intermináveis.
Mês após mês. Semana após semana. Dia após dia. Sono após sono. Bastava fechar os olhos. Que estão sempre abertos e atentos. Ou ansiosos. Às vezes melados. Outras vezes preocupados. Sempre felizes.
Nos sonos, ela tudo fazia para o levar. Para o catapultar para novas dimensões de prazer. E de sentir. De sentir.
Sobretudo de sentir e estar.
Sonhava. Nem sempre. Nem sempre sonhava.
Era tudo real. As sensações, os tactos, os perfumes, odores.
Músicas. Até as músicas. Mesmo que os sonhos nem sempre tenham sons ou cores.
Sonhava. Suava sem se mexer e sem calor. Ou com frio. Achava que não se mexia. Pensava que não tinha calor. Não sentia o frio.
Mas suava e sentia o corpo. O outro. Que era seu. Que era deles. Que era um só. Ou que não era de ninguém.
Porque há corpos que não são de ninguém.

Monday, July 30, 2007

Verão

Verão. E desejos. E vontades e sabores. E já não se sabe que águas cruzam quais.
Água. Frescura. Banhos e delícias. Espuma (de amor) e Sim (depois de uma pergunta).
Apareceste. (Foi mesmo agora).
Há correntes que desaguam. Há ideias que não se concretizam.
Quer-se tempo. Quer-se vida.
Dormir acordado.
Abraços e fobias. Beijos e cansaços. Satisfação mental e desastre físico.
Acordas e sonhas. Dormes e sonhas acordada. (Sim. Sim de novo)
Não se sabe.
Nada se sabe.
Guardam-se conversas para depois e faz-se perguntas de resposta feita.
Depois partilha-se e não se sobe. Não. Não. Tempo.
Aí está o tempo.
Vamos?
Quando?
Sem fugir?
Mas estar e sentir!

Sunday, July 29, 2007

Fado

Sabe a loucura o Fado que há em nós. Sabe sempre a Vida e a Saudade.
A Portugal e Mar. A lágrimas e sentimentos em silêncio.
Sabe a cordas dedilhadas em harmonia e a camas desfeitas pelo Amor.
Sabe a Mundo perfeito e a horizonte com Futuro.
Sabe a sangue que arrepia. E a Luzes que não se apagam.
Sabe-me a mim e a ti.
A Nós. Sempre.

Tuesday, July 17, 2007

Outra vez as cidades, janelas e recordações

Da janela do meu quarto não se via a cidade. Nunca cheguei a soprar nas cortinas e pouco, pouco mesmo, tempo dediquei àquele quarto, que até me pareceu acolhedor.
Como a cidade.
Há locais pelos quais nos apaixonamos à primeira vista, mesmo nunca tendo acreditado muitos nos amores à primeira à vista. (Há, não há?).
As cidades são como as pessoas. Sempre acreditei que sim.
Sempre acreditei que as pessoas são como os locais e, estes, como por quem lá passou.
Esta cidade é como as pessoas. As que lá habitam, mas sobretudo por aquelas que por lá andam.
De férias. A trabalhar. De férias e a trabalhar. Tudo misturado, como são as confusões mentais.
Gosto de cidades e de sinais. Gosto de ficar marcado pelas cidades. Da mesma forma que gosto que as pessoas me marquem. E tento marcar as pessoas. Da melhor ou da pior forma. Às vezes, da pior.
Há cidades perfeitas. Cidades idilicas. Cidades que chamam por nós. Da mesma forma que nós chamamos por elas.
Bruxelas foi, para mim, uma cidade assim. Marcante e entusiasmante.
Pelas amizades que (re) encontrei.
Mas muito pelas ruas do encantamento.
Cada uma delas cheia de história. Cheia de memórias e recordações.
Repletas de vida. De vidas boas. De pessoas felizes.
Uma cidade que nos obriga a entrar. Perceber o conceito e viver.
As cidades, se calhar, são todas assim.
Eu estava disponível.
E gostei.
Da cidade e das partilhas.
Gosto de cidades que gostam de nós.
(Tinha de dizer isto).

Monday, July 16, 2007

Agarrar a luz com um anzol

"Rir é bem melhor que chorar".
Lembrou-se, no imediato momento, das esperas.
Das praias, porque era Verão, e das noites, porque eram quentes.
Recordou-se da paciência do Pescador.
Um pescador enamorado. Pelo mar. Pela vida.
"Há melhor paixão que (saber) viver?".
Depois perdeu-se em histórias que não eram dele, mas que tinham sido. Nessas épocas.
Conversas pela madrugada, às vezes nos finais de tarde, com pescadores que apareciam. Ou ele é que aparecia?
"Gosto deste sossego. A pesca pode ser mesmo o melhor exercício mental".
Acreditou.
E prosseguiu.
Aprendia sempre com os pescadores.
Aprendia sempre com todos.
E.
Depois.
Havia Aquelas pessoas que tinham nascido com dons.
O Dom de fazer bem às outras. Pessoas.
As férias nunca queriam descanso. Exigiam descobertas. Os amigos estavam lá. Mas era estranhos que procurava.
As férias eram descobertas. De outros. Dele.
Procurava. Falava. Sentava-se e nem sempre conversava.
Ouvia.
Desabafos e histórias. Mentiras e Verdades. Quase sempre verdades. Porque até as mentiras são verdades.
Fixou-se, durante minutos que pareceram segundos, num pescador.
O Solitário.
Como ele.
"Como corre?".
"Bem. Acabei de pescar A luz".
Boas férias!

Sunday, July 15, 2007

Praia

O Momento:
Final de Setembro. Ou ainda Agosto ou Julho. Ou mesmo Junho. Até podia ser Inverno. Primavera ou Outono. Outono sabia sempre bem. E Fevereiro também. O Mês. Final de Janeiro.
Desconheciam horas e meses. Dias e segundos.
O Desejo:
Uma praia. E a água. Revoltada. Serena. A Água.
Ondas que vinham. E iam sempre com saudade.
Mares tranquilos que se uniam ao céu. Azul. Como são os céus e os sonhos.
(Mesmo que haja sonhos sem cor).
Não sabiam a hora, mas devia ser final de tarde. Não enganavam os crepúsculos. Esses momentos em que os navegadores conferem a sua posição estimada, comparando a abertura esperada em graus com a observada do horizonte ao astro.
Céu limpo e brisas suaves. Calor humano e ventos que traziam gotas carinhosas, às vezes frias, que arrepiavam, contra os corpos. Quentes.
Línguas enroladas e sôfregas. Abraços que se confundiam e carícias sem destino. Pés que se misturavam e deixavam de ser próprios.
Afagos despreocupados e sedentos de destinatários. Que se desconheciam sempre. Amálgama de sentidos e corpos:
“Não sei que corpo mimo”.
“É o nosso”.
Idas e vindas ao sabor das marés. Risos. E abraços sempre. Uniões.
Desenhos no firmamento. Que se completavam nas cambalhotas que o Amor dá.
Gritos que se confundiam com as juras entre gaivotas.
Sorrisos que se permitiam e perpetuavam.
E marcas.
Marcas na areia.
Marcas de desejos.
De sentimentos e prazeres.
Marcas de movimentos bruscos.
E calmos.
E sempre harmoniosos.
Com ritmo próprio.
Com vida.
Marcas inapagáveis.
Que a maré não levaria.

Equador

Equador é a linha imaginária que resulta da intersecção da superfície da Terra com o plano que contém o seu centro e é perpendicular ao eixo de rotação. Devido à oscilação do eixo de rotação, a posição do equador não é rigorosamente constante, razão pela qual é adoptada, para efeitos geodésicos, uma posição média. O equador divide a superfície da Terra em dois hemisférios: o Hemisfério Norte, ou Setentrional, que contém o Pólo Norte; e o Hemisfério Sul, ou Meridional, que contém o Pólo Sul. O raio do equador é cerca de 6378 km, a que corresponde um perímetro de 40 075 km.

É assim o Equador. Uma linha mítica que divide a Terra, no fundo, o Mundo, em dois.
Mas há Mundos indivísiveis.
Que são inseparáveis.
Capazes de resistir às linhas que os (tentam) afastam.
Incapazes de permitir um limite. Incapazes de tolerar uma força que os repelem.
Os Mundos, quando são bons e desejados, não se separam. Nem permitem.
Aproximam-se e desenham linhas.
Linhas de União.

Wednesday, July 11, 2007

Moinhos do tempo


Passámos neste moinho sem saber. Ou sem o sentir. A ideia era procurar a história numa qualquer maravilha, que já era nossa e passou a ser de Portugal pouco tempo depois.
Recebeste um telefonema enquanto descansávamos.
"Precisam de alguma coisa ou estão só a descansar?".
Respondemos que não precisávamos de nada. Que descansávamos. De quem?
“Ela já conhecia”, disseste-me, atirando que querias a vitória dos “Verdes”.
E não precisávamos de nada mesmo.
Estávamos bem.
Até arrisco que muito bem.
Havia aromas floridos por aí.
“Hummm… estas flores!”
Havia paisagens e campos sem distância.
(Ainda há, não há?)
“Há sempre”, respondeste. A uma pergunta qualquer sem sentido.
Muralhas e imagens para sempre.
Abraços e caminhos até ao fim.
“Vamos correr nestas muralhas. São a nossa história”.
(Pensei agora).
Se formos embora, para onde vamos?
“Vamos por aí. Sabemos sempre onde ir”.
E depois fomos.
E vamos.

Banheira

Depositaste teu corpo na banheira deserta.
Depositei-me em ti.
(Caminhinhos)

Tuesday, July 10, 2007

Mais tempo nas memórias dos lençóis

O Sol bateu-lhe na cara e sem licença instalou-se no quarto que era deles. Acordou. Ela permitiu-se a mais tempo nas memórias dos lençóis. Brancos.
Aproximou-se da janela. Que lhe abria as portas da Liberdade. Uma pequena varanda, em pedra, suportava-o do cansaço da noite.
Sentia-se feliz e determinado. Sobretudo determinado.
As caminhadas do dia anterior. Dos dias anteriores. Tinham sido diferentes.
(Re)Descobrir a cidade sem memórias. Apenas com um pensamento: aproveitar todos os minutos, todos os segundos, todos os suspiros e gemidos. Como se fossem os últimos da vida dele. Das deles.
Acendeu o primeiro cigarro, ainda intoxicado pelos outros da noite anterior. Que tinham sido muitos. De vários sabores.
O fumo encheu-lhe os pulmões. Sorriu. E manteve-se firme.
Em baixo, na rua, os passos continuavam apressados. O cosmopolitismo da cidade deixava-o sereno.
Dentro, no quarto, o sono continuava tranquilo. O dela. A sorrir. Porque sorria sempre quando dormia (Imaginação?).
Acendeu novo cigarro. Antes tinha-se despido por completo. Gostava de fumar nu. De se sentir livre na janela aberta para a Liberdade.
A varanda que lhe suportava o cansaço (das caminhadas?) permitia-lhe a nudez total e despudorada.
Nunca há vergonha na noite. Nunca há vergonha na manhã. Há vergonha? Em não assumir.
O ar da cidade, comprido e profundo, misturava-se com o fumo. Nos pulmões que exigiam mais. No coração que pedia mais.
Ela acordou. Abraçou-o por trás (nos sonhos e desejos é sempre ao contrário). Deixou-lhe, sussurrando, um bom dia tímido mas convicto.
Porque esse era mesmo o desejo. Um bom dia. Uma vida boa.
Ele estava feliz. Ela já suspeitava. Mas nada dizia.

Um livro no colo


Sentada.
Permanecia sentada e à lareira, apesar de ser Verão e não estar cansada.
O livro, às vezes no colo.
Outras a rolhar as centelhas do fogo e a aconchegar-lhe a mente.
Desejava ler e sonhar. Imaginar o que lia e desejar o que sentia.
(Sentir o que desejava tornava-se mais fácil).
Ansiava recuperar tempos e imagens. Sonhos e delírios. E mantinha-se assim.
Vaga. Distante. Mas tranquila. Tudo era inconsciente.
Lembrava-se das manhãs e das tardes. E recordava-se dos pedidos satisfeitos. Das celebrações efusivas. Dos abraços eternos e das noites sem dormir. Das cumplicidades alheias e das mentes perdidas e sem cor.
A preto-e-branco via linhas de fumo e sentia a água. Que era quente e arrepiava.
Chamava sabores e cheiros. Promessas simples e sinceras. Gritos de dor (e de prazer). Palavras que nada significavam ou que tudo diziam.
É para sempre e não é mentira.
O pêndulo já tinha sido alcançado.
A partir de agora era sempre a descer e a comparar. A escalada ao topo já tinha sido conseguida.
Permanecia sentada e à lareira. Era Inverno (da tristeza) e estava cansada.

O livro. Sem páginas. Nem nome.
Tinha 94 anos e recordava os capítulos da vida.

Enquanto houver estrada para andar

As estradas são cada vez mais largas e as distâncias cada vez mais curtas.
Os quilómetros percorridos calcam os dias e as noites.
A distância, curta, torna-se dolorosa. Porque é distância.
E as distâncias doem.
Os sonhos dissipam-se e avivam-se. As memórias funcionam como suporte das mágoas. E acredita-se.
Depois tudo esmorece num só gesto. Tudo o que se acredita cai por terra. E morre.
Mas recupera-se do susto. Das dores e das certezas (que afinal são só minhas).
(É paranóia? Delírio? É certeza? Ou não?).
De noite, há empurrões e olhares de soslaio para as memórias que perduram. As inevitáveis comparações invadem-lhe a mente. Mas acredita-se de novo.
Porque é que se acredita sempre mesmo quando a fé é dolorosa?

Friday, June 22, 2007

Anda

Anda.
Deita-te e suspira.
Sorri.
Deixa-me abraçar-te.
Entrelaçar nossas mãos.
Vou
Ver-te
Adormecer.

Wednesday, June 20, 2007

O abraço

Tinha pensado num abraço logo na primeira noite. Que se descobriu depois que tinham passado de mão dada.
Na noite seguinte (que não foi a seguinte, mas que poderia ter sido), pensou de novo num abraço.
Mas não teve coragem de pedir. Ou achou que não era o momento.
Acreditava que o abraço era a forma de perceber se os corpos se conheciam e se queriam.
Quando se abraçaram percebeu tudo. Que sabia desde sempre. E em que acreditava. E que continuava a acreditar. Apesar de tudo.
Andavam perdidos nas ruas quando aconteceu. Ou melhor, já tinha acontecido antes, mas foi na escuridão da rua e das sensações que tudo se tornou nítido.
Ela disse-lhe que gostava de se deitar na relva. Debaixo das árvores e completar os espaços das folhas ou dos ramos.
Achou estranho. Mas percebeu.
Percebia sempre.
Dançaram até à madrugada dos sentidos. Apuraram-se e desejaram-se.
E despediram-se pouco depois, entre palavras tímidas, beijos e tremores.
E abraçaram-se. Finalmente.

Monday, June 18, 2007

A revolta do Mar

Do mar pouco se sabe. Não se sabe bem para onde vai. De onde vem. Porque galga barreiras e alcança o quase inalcançável.
Tem fome de crescer. Penso sempre. Quer mostrar a sua força. Penso também.
Gosto do Mar de Inverno. Não gosto do Mar de Verão.
Acho que é sempre bom conselheiro.
Pede-nos impulsos. Pede-nos para abraçar os desejos.
Gosto de sentir a neblina matinal. Os farrapos de água que saem das ondas. Duros e Fortes.
Verdadeiros.
Gosto do Mar de Inverno.
É frio. É rebelde. Está revoltado.
Não teme nada nem ninguém.
É livre.
É puro.
Vai e vem ao sabor da Lua.
(Nunca imaginei que fosse a Lua a decidir as voltas do Mar).

Sunday, June 17, 2007

Sentir medo

Sentir medo. Enquanto caminhava em ruas que lhe sabiam a novidade, apesar de até já lá ter estado, sentia que aquilo não podia estar a acontecer. A noite estava muito clara. Demasiado clara. Achava.
Pelo menos sentia-a assim. Transparente.
(Ainda que a tentar mostrar o contrário.
Porque é que a noite nos mostra sempre o seu lado mais verdadeiro?).
Caminhava e respirava o ar diferente que estava em promoção.
(Respirar em cidades diferentes: Que transfusão de sangue divina!).
Caminhava porque não flutuava.
(E a ideia tinha saído daquela harmonia flutuante que o arrepiava).
Ouvia sons que lhe pareciam difusos, ainda que translúcidos. Gostava sempre de sentir o aroma da história de cada cidade. Os olhares. Distantes. Ele preferia focalizá-los na história.
Nas fachadas históricas. Nas pedras gastas das peregrinações turísticas. Gastas de fé.
(Onde está a fé?).
Imaginava cada passo. Cada sorriso. Cada paragem. Cada beijo.
Estava tranquilo. Sentia-se traído. Vivia com essa dualidade empunhando sorrisos e não armas de destruição de construções partilhadas. O vento soprava forte. Estava frio. Ele estava.
Arrepiado. Com o frio. Cortante como um punhal certeiro no sopro do coração.
Era uma viagem no tempo. Afinal, era uma viagem no tempo.
As cores eram diferentes. Até a música era diferente.
Porque é que era diferente? Ele já sabia.
Sabia que a ideia que tinha saído daquela harmonia flutuante que o arrepiava não estava ali. Não estava a ser cumprida. Não podia estar. Imaginou-se um trapezista. A sobrevoar a cidade. No limite. Desiquilibrado. Cairia? Ou lutaria pela Vida? Decidiu lutar. Era um resistente. E acreditava.
Um amigo perguntou-lhe, um dia (é sempre num dia que se fazem perguntas), se nunca tinha sonhado que voava. Ele respondera que não. Não precisava de asas para voar. Nem de sonhos.
Andava a voar há tanto tempo! Achava que desde sempre. E estava decidido. Ia perguntar. Ia deixar frases a meio para que fossem completas. Ia trazer outras histórias para que outras fossem contadas. Não precisava de saber porque já sabia. Mas achava que merecia ouvir. Achava que merecia ouvir. Achava que merecia essa lealdade. Essa sinceridade. Mas nem se preocupava com isso. Essa opção era livre. À saída deixou-lhe a última dica. Voltou a não ser bem sucedido. Lutou. Colou. O abraço (oferecido sem pudor e em segredo) transformou-se em elo final. Ia cair. Se não desse a mão. São assim os trapezistas. E a cidade. A cidade é uma cidade de trapezistas. De circos. De vidas boas. De recordações. De sonhos. De lembranças únicas. De segredos. Outra vez de vidas boas. De jardins e parques. Flores e romances. Cafés. Cigarros. Quartos e suores. Amores e traições. Abraços e Adeus. A partilhar. Ou não. Tanto faz. Interessa a verdade. E o momento.
(Porque é que a noite nos mostra sempre o seu lado mais verdadeiro?)
Porque essa é a certeza. Ser verdadeira. E foi. É de noite.
E foi.
A ouvir Xutos. Num domingo. Depois de uma sexta.
Sei onde tu estás. Era o álbum.
E sei.
E quero saber.
E quero ficar.

Wednesday, June 13, 2007

Sim?

Parámos aqui um dia.
Nao sei se já cá tinha estado.
Sei que sim, mas não quero saber. Nem tanto lembrar.
Há nuvens e castelos que só se sentem uma vez.
Parámos e andámos.
Ou nem parámos.
Agora já não sei se lá estivemos.
Tu estiveste.
Descobri que tinhas estado.
No dia em que fui lá contigo.
Num dia em que lá estivemos juntos.

A La Mort Subite

Brilhante descoberta.
O encanto de saborear uma cidade.
Sozinho.
(de mão dada com o mundo).
Em sintonia com o espírito.
A La Mort Subite!
Estranho.
Sincero.
Absorvente.
Gostei e quero repetir.
(sabemos que assim vai ser).
O dia exigia cama.
A mente exigia sabores.
Saí.
Entrei.
Pedi.
Escrevi.
Gostei.
Porque é que gosto sempre de uma mão dada numa cidade desconhecida?

Tuesday, June 12, 2007

(desde) Sempre

O velho relógio da estação marcava 10:40. Por aí.
A luz (do dia) simbolizava o mesmo.
O sol rastejava para o topo e escondia-se pouco nas ráfias das nuvens perdidas.
Caminhava acelerado. E não estava atrasado.
Era um dia assim.
Parou.
Não estava cansado.
Uma silhueta luminosa tinha-o colocado atento.
Quem és? Pensou.
Recordou-se então de outro final de viagem. Julgava que há quatro anos.
De autocarro. Essa recordação. Essa viagem.
À época, chuva. Dia cinzento. Cores dispersas.
Mas a mesma sensação.
Quem és?
Seguiu-a.
Voltou a entrar na estação. Subiu. Para o comboio.
Só relances. Mas a direcção certa.
Sentia-a cada vez mais perto. Recordou-se dos cheiros de há quatro anos.
Lembrou-se da chuva.
E hoje havia sol.
Que não se escondia.
Começou a correr. Empurrões. Gritos. Quedas.
Serenou.
Tinha-a perdido.
Há quatro anos também.
Saiu do comboio. Em outra estação.
Regressou a pé. Tranquilo. Feliz.
Nunca se perde aquilo que se tem (desde) sempre.

Sunday, June 10, 2007

Tacto

Os olhos fechavam-se e abriam-se com o mesmo ritmo dos corpos. Entregues!
O cansaço era derrotado pelas ávidas energias que brotavam das almas.
Não existe tempo (mas é sempre pouco).
Os sentidos? No apogeu do delírio!
Nunca se faz o que se planeia porque nada se planeia.
Tudo ocorre sem sentido. Sem dúvidas. Só certezas.
A sensibilidade (de que já tinham falado) arrepiava na penumbra.
Havia luz. Mas à distância.
(Inesperada esta nova forma de abordarem os desejos).
De novo os sentidos:
A Audição. Sim. Havia música. Outra vez aquela da recordação (são viagens que se fazem sem temores. “Às vezes desapareces e deixas de saber quem sou. Se calhar, até, deixas de saber quem és”).
A Visão. Bastam os olhares. As explorações enigmáticas de corpos. Desesperados. (Pareceu-lhe).
O Olfacto. Sempre o olfacto. Sempre novas descobertas. (“Conheço-te tão bem”).
O Paladar. Sal. Mel. Açúcar. Uma mescla imperceptível. Mas fiel e leal.
E depois.
Depois o tacto.
“Fica aí mais um bocadinho”.
Até à exaustão. Até sempre.
“Desculpa”.

Saturday, June 09, 2007

Estranha forma de lucidez

Embriagado de novo.
(Deixas-me sempre assim).
Somos nós, acho. Que criamos essa estranha forma de lucidez.
Em que tudo é permitido. Ou quase.
Pediste-me um abraço.
Não recusei. Mas tinha fugido antes. Não sei porquê.
Não sei porquê.
Como se pode recusar um abraço?
Como se pode recusar o silêncio?
Como se pode recusar o calor do teu ventre?
O sabor do teu corpo?
A magia que se desprende do teu peito?
O brilho que os teus olhos emanam?
A harmonia dos corpos enrolados?
A certeza com que apresentas novas ideias e propostas?
(“Não devia ter-te dito isto”.
“Também já te fiz um pedido. E mais intenso ainda”).
Não fugi.
Não fugi.
Nunca quis fugir.
Quero ficar sempre.
E, mesmo quando saio, fico sempre.

Porque é contigo que se fundem os gritos.

Que se perdem os medos.

Que se cruzam os laços.

Que se soletra o verbo ficar.

FICAR!

10

Apenas de um acaso.
Começou assim:
- “Diz-me qual o número da música”.
Já descobrimos.
Calhou ser o 10. Esse emblemático número.
Até já foi um 107.
Hoje. Com a cabeça na matemática de outra recordação da música, foi o 10.
Ficou.
E gostei!
(Gosto sempre).
Porque é que a música nos deixa nostálgicos?